Há um tempo atrás, fiz um post sobre minha participação em um grupo de pesquisa como bolsista de Iniciação Científica durante minha graduação na PUC RIO.
Os próximos posts serão dedicados a relatar as experiências, procedimentos, divulgação e análise de materiais identificados no decorrer deste trabalho, que foi realizado entre os anos de 2006 e 2007. Muito do que será apresentado aqui estão baseados em registros e relatórios de pesquisa feitos na época.
Representações de índios. Repertórios para a nacionalidade na nova ordem republicana.
Coordenado pela Prof. Dra. Eunícia Fernandes e contando com a participação de três bolsistas de Iniciação Científica, o projeto tinha como objetivo verificar quais eram as representações
públicas e compartilhadas acerca dos indígenas durante a Primeira
República, identificando possíveis conexões destas representações
com um discurso sobre o nacional. Procuramos pensar como a sociedade
via e pensava o elemento indígena no novo momento republicano, o que
implicava num processo de construção da cidadania.
Para
isto, tivemos o objetivo de construir um repertório de imagens
produzidas pelos periódicos publicados na capital da República no
período de 1889-1930. É importante destacar a opção de
trabalharmos com imagens a partir do momento em que as consideramos
como uma apropriação da realidade, isto é, uma forma de expressar
e interpretar o mundo e também como uma construção social. As
imagens são um importante instrumento de divulgação de ideias e
de discursos, pois é uma linguagem que tem um alcance expressivo na
sociedade atingindo também os grupos iletrados.
A intenção inicial era trabalhar com
diversos periódicos, onde cada bolsista integrante do projeto
ficaria encarregado por um. Mas algumas dificuldades encontradas no
decorrer da pesquisa, como a inviabilidade de acesso aos periódicos
disponíveis na Fundação Casa de Rui Barbosa, que estava com a sua
Biblioteca em reformas, e alguns periódicos não disponíveis para
consulta na Biblioteca Nacional levaram a uma mudança de planos. A
proposta inicial foi então alterada, resultando na concentração de
um periódico apenas, sendo escolhido a revista semanal O
Malho. A escolha por este
periódico específico se deu pelo fato do mesmo ter uma publicação
que se estende por um longo período compreendendo especialmente a
temporalidade definida pela nossa pesquisa e, principalmente, pelo
fato de termos na Biblioteca Nacional todo o material microfilmado e
disponível para consulta.
Com
apenas um periódico a ser mapeado, a divisão temporal foi o
critério que definiu o trabalho de cada bolsista. As edições do
periódico a ser pesquisado estavam delimitadas entre os anos de 1906
a 1930. Com uma equipe formada por 3 bolsistas - 2 bolsistas de IC
FAPERJ e uma bolsista voluntária - o periódico foi dividido de
forma que uma bolsista ficasse responsável pela pesquisa dos anos
iniciais, a outra pelos anos intermediários e a última pelos anos
finais.
Coube a mim pesquisar os anos finais
do periódico, sendo importante destacar que, ao contrário das
outras bolsistas que pesquisaram os anos de forma crescente, fiquei
encarregada de proceder a pesquisa de forma decrescente, isto é,
iniciá-la pelo último ano. Sendo assim, o primeiro ano
pesquisado foi o ano de 1930, seguido pelo ano de 1929 e assim por
diante. Durante os dois anos de concessão da bolsa, pesquisei e
cataloguei as imagens de índios publicados em O
Malho durante o período de
1930 a 1915, portanto, 15 anos de publicação da revista.
A
coleta do material se deu pela localização das imagens no periódico
e pela catalogação das mesmas em fichas de imagens. Nestas fichas
foram cadastradas as informações referentes às imagens como a data
da publicação e número do periódico, o autor da imagem, descrição
e transcrição de textos que acompanham as mesmas. Inicialmente a
ênfase se dirigia às charges publicadas pela revista, mas no
decorrer do processo de pesquisa foram localizados diversos outros
tipos de imagens como fotos e propagandas. Dessa forma, fez-se
necessário fazer alterações na ficha de imagem que havia sido
elaborada no inicio da pesquisa a fim de se identificar todos os
tipos de imagens encontradas nos periódicos.
Além disso, foi incluído um campo
denominado Observação
para que pudesse ser feito qualquer outro tipo de anotação ou
referência a respeito das imagens localizadas. Segue abaixo um modelo
das fichas preenchidas no decorrer da pesquisa.
ANO |
1927
|
Dia
– Mês
|
26 de
Fevereiro
|
Nº
Periódico
|
1.276
|
Autor
da Imagem
|
Ângelo
Agostini
|
Localização
na Página
| 2 Páginas inteiras |
Tipo
de Imagem
|
Charge
|
Título
| SEMPRE OS MESMOS HOMENS |
Descrição
da imagem
|
Na primeira
página: Uma grande
cortina traz inscrita o título da charge: “CANDIDATOS E
ELEITORES”. Uma mulher está suspensa pela cortina e segura no
alto uma cadeira com a inscrição “PARLAMENTO”. Na sua saia
está a inscrição “ELEIÇÃO DIRETA” e vários homens tentam
se segurar na saia para serem puxados pela mulher. Alguns ficam
suspensos, outros caídos e no meio destes está a inscrição
“CANDIDATOS”. Atrás da cortina, um menino vestido de palhaço
observa a cena e sorri.
Na
segunda página: na
parte inferior, um grupo de homens desesperados rodeiam um
indígena, jogam-se uns sobre os outros tentando chegar mais
perto. Trazem um pedaço de papel na mão e tentam entregá-lo ao
índio que tapa os ouvidos e demonstra não agüentar as súplicas
e barulho provocado por estes indivíduos.
O
espaço superior da imagem é composto por várias cenas e suas
respectivas legendas.
Cena
1: Um homem tem nas mãos
maços de dinheiro.
Cena
2: Dois homens conversam
e um deles parece indignado.
Cena
3: Um homem interpela o
outro que está à sua frente e este se volta para trás.
Cena
4 : Dois homens sentados
numa cadeira conversam.
Cena
5: Um homem sai por uma
porta enquanto outro, do lado de dentro, a fecha.
Cena
6: Um homem está
ajoelhado aos pés de uma mulher enquanto outro espia a cena
escondido atrás de uma cortina.
MARIDO
– Hein, um desconhecido aos pés de (ilegível).
Cena
7: Mulher explica ao
marido o acontecido na cena anterior. Os três personagens estão
na cena e o marido está entre a mulher e o cortejador.
|
Dizeres
|
Como
o grande Agostini criticava as eleições geraes há cerca de 50
annos passados.
|
OBS
|
Existem
outras cenas e detalhes na charge, mas a imagem está muito clara
e falhada não permitindo a descrição de outras cenas que a
compõe nem as suas respectivas legendas.
|
Tendo como exemplo a esta ficha, podemos fazer algumas observações a respeito da prática da pesquisa. A catalogação desta imagem e as informações contidas no campo Observação podem explicitar algumas dificuldades encontradas no decorrer do trabalho. O material microfilmado muitas vezes apresentam falta de nitidez não permitindo uma completa descrição da imagem ou dos textos que acompanham a mesma. As imagens se apresentam muito claras ou muito escuras, ou então falhadas devido ao estado de conservação do material original. Outras vezes, faltam determinadas edições do periódico e em algumas edições faltam páginas.
O recurso das fichas, onde procurávamos descrever as imagens localizadas, foi um recurso que visava, não só uma forma de catalogação, como também um recurso que visava compensar nossas dificuldades de reprodução das mesmas. Se hoje a revista O Malho encontra-se disponível online no site da Biblioteca Nacional e no da Fundação Casa de Rui Barbosa, onde qualquer pessoa pode ter acesso e visualizar todo o seu conteúdo, na ocasião da pesquisa não existia esta facilidade. Qualquer reprodução passava por um processo burocrático e implicava em gastos que naquele momento não tínhamos como arcar.
Outra prática da pesquisa dizia respeito às reuniões periódicas com o grupo a fim de se fazer um levantamento do material coletado e também uma reflexão sobre o mesmo. Nestas, a discussão girava em torno da prática de pesquisa, como por exemplo, as dificuldades encontradas no andamento dos trabalhos, material danificado, ilegível ou incompleto. Era o momento onde podíamos fazer uma relação entre a teoria, já que éramos alunas da graduação, e a prática do historiador; espaço onde podíamos estabelecer relações entre as leituras feitas ao longo do curso e as impressões obtidas a respeito do material localizado.
Era também o momento em que descrevíamos para os integrantes do grupo as imagens que havíamos localizado em nossas visitas à Biblioteca Nacional. Isto significa dizer, que muitas das imagens identificadas por mim e por minhas colegas de pesquisa ficavam no "campo da imaginação", já que somente tínhamos conhecimento da imagens através da descrição e do relato feito por quem as viu.
O recurso das fichas, onde procurávamos descrever as imagens localizadas, foi um recurso que visava, não só uma forma de catalogação, como também um recurso que visava compensar nossas dificuldades de reprodução das mesmas. Se hoje a revista O Malho encontra-se disponível online no site da Biblioteca Nacional e no da Fundação Casa de Rui Barbosa, onde qualquer pessoa pode ter acesso e visualizar todo o seu conteúdo, na ocasião da pesquisa não existia esta facilidade. Qualquer reprodução passava por um processo burocrático e implicava em gastos que naquele momento não tínhamos como arcar.
Outra prática da pesquisa dizia respeito às reuniões periódicas com o grupo a fim de se fazer um levantamento do material coletado e também uma reflexão sobre o mesmo. Nestas, a discussão girava em torno da prática de pesquisa, como por exemplo, as dificuldades encontradas no andamento dos trabalhos, material danificado, ilegível ou incompleto. Era o momento onde podíamos fazer uma relação entre a teoria, já que éramos alunas da graduação, e a prática do historiador; espaço onde podíamos estabelecer relações entre as leituras feitas ao longo do curso e as impressões obtidas a respeito do material localizado.
Era também o momento em que descrevíamos para os integrantes do grupo as imagens que havíamos localizado em nossas visitas à Biblioteca Nacional. Isto significa dizer, que muitas das imagens identificadas por mim e por minhas colegas de pesquisa ficavam no "campo da imaginação", já que somente tínhamos conhecimento da imagens através da descrição e do relato feito por quem as viu.
A prática da pesquisa também permitiu a
discussão com colegas que integravam outros projetos. Esta discussão possibilitou
o encontro do nosso grupo com outra equipe. Foi um momento muito interessante, já que tivemos a oportunidade de conhecer outros projetos que estavam sendo produzidos
pela Universidade e, especificamente, pelo Departamento de História. Apesar do
outro grupo possuir uma linha e um objeto de pesquisa diferente e também
trabalhar com uma temporalidade diversa, tínhamos uma temática em comum: a questão
da identidade. Foi interessante perceber como a mesma questão era tratada por
cada grupo e quais materiais e fontes estavam sendo utilizadas, como cada grupo
se apropriava deste material e quais eram as leituras teóricas que estavam conduzindo o
trabalho de cada um.
Uma dificuldade encontrada durante o ano de 2006, foi
as freqüentes paralisações promovidas pelos funcionários da Biblioteca
Nacional. Como não havia um aviso prévio sobre essas paralisações, muitas vezes
encontrávamos a Biblioteca fechada, dificultando o acesso
ao material. No ano de 2007 esta
dificuldade aumentou, pois a Biblioteca Nacional ficou fechada durante cerca de
três meses devido a uma greve dos funcionários do Ministério da Cultura,
impedindo o acesso ao material a ser pesquisado.
Como tínhamos extrema necessidade de dar
continuidade à pesquisa e também de reproduzir alguma imagens para elaboração
de um pôster a ser apresentado nos painéis de Iniciação Científica do Encontro
Nacional de História da ANPUH, recorremos à Biblioteca da Casa de Rui Barbosa.
Aberta após vários meses em obras, esperávamos encontrar nesta Biblioteca um
expressivo acervo que nos possibilitasse dar continuidade ao trabalho.
Apesar de conseguirmos a reprodução das
imagens que necessitávamos, encontramos uma outra dificuldade: além de não ter
disponível várias edições e até mesmo anos inteiros do periódico, todo o acervo
de O Malho estava separado para a digitalização e ficaria indisponível
para a consulta durante tempo indeterminado. Mas com a colaboração e
solidariedade dos funcionários e da Bibliotecária responsável, conseguimos o
acesso ao periódico e ao maior número possível de reproduções de imagens.
Um primeiro relatório foi
entregue a FAPERJ onde foram apresentados os resultados da pesquisa durante o
período correspondente ao início de concessão da Bolsa de Iniciação Científica
em 01 de Janeiro de 2006 até Julho do mesmo ano. Neste relatório, o período
analisado correspondia aos anos de 1927 a 1930. O relatório final foi entregue em Outubro de 2006 com vistas à renovação
da bolsa. Neste, a pesquisa já havia progredido de forma significativa apesar
das dificuldades já relacionadas, abrangendo os anos de 1925 e 1926. No relatório final da pesquisa, produzido em dezembro de 2007, o período analisado comprendeu aos anos de 1924 a 1915 (lembrando que pesquisei os anos de publicação de forma descrescente).
Dado o panorama de desenvolvimento da nossa pesquisa, nos próximos posts procurarei apresentar o material coletado durante a mesma. Além das imagens de índios identificadas e catalogadas, que por sua vez, foram objetos de análise em artigos e trabalhos apresentados em seminários e encontros acadêmicos, a pesquisa identificou em O Malho outros materiais e temas que contam muito sobre a história do nosso país.
Estes temas serão apresentados de maneira geral, pois o objetivo aqui não é de fazer uma análise dos mesmos, mas de apresentar os conteúdos da revista que mais me chamaram a atenção na época e que terminaram por merecerem destaque nos meus registros de pesquisa. Na medida do possível, sempre que for identificado um tema que tenha sido objeto de análise historiográfica e que tenha tido O Malho como fonte, ele será indicado aqui. Também irei postar as imagens que na época só eu tive acesso e que ficaram, portanto, no "campo da imaginação" dos outros integrantes da pesquisa.
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