segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Nota da Associação Nacional de História - Núcleo Rio de Janeiro - sobre o PCCR dos Professores da Prefeitura do Rio de Janeiro


NOTA SOBRE O PROJETO DE LEI Nº 442/2013, QUE “DISPÕE SOBRE O PLANO DE CARGOS, CARREIRAS E REMUNERAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS DA SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS”

Excelentíssimos Senhores Vereadores da Câmara Municipal do Rio de Janeiro,

Dirigimo-nos a Vossas Excelências para manifestar nossa preocupação com a possibilidade da aprovação, pela Câmara Municipal do Rio de Janeiro, do Projeto de Lei n.º 442/2013, de autoria do Poder Executivo, que “Dispõe sobre o Plano de Cargos, Carreiras e Remuneração dos funcionários da Secretaria Municipal de Educação e dá outras providências”.


Referimo-nos, especialmente, aos dispositivos do Projeto de Lei que definem a criação, no Quadro de Pessoal do Magistério, do novo cargo de “Professor do Ensino Fundamental - PEF” para o exercício de atividades docentes em turmas do primeiro ao nono ano (artigo 4º, inciso II e respectivos parágrafos); e à previsão de mudança de denominação e migração, para o novo Quadro de Pessoal do Magistério, de servidores que atualmente detêm o cargo de “Professor I” (artigo 18º, inciso II e respectivos parágrafos e artigo 27º), cuja extinção, portanto, passa a ser prevista na medida em que ocorra a aprovação e a progressiva implementação do novo “Plano de Cargos, Carreiras e Salários”.

O cargo de Professor I é aquele integrado por profissionais com habilitação em nível superior, em curso de Licenciatura Plena, exercendo suas atividades nas escolas da Rede Municipal especificamente na disciplina habilitada do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental e na Educação de Jovens e Adultos. Trata-se, dessa forma, de profissionais cuja alta qualificação foi auferida em cursos de graduação como aqueles que representamos, os quais se estruturam a partir de um abrangente conjunto de disciplinas teóricas e práticas, entre outras atividades, voltadas à formação de professores para o ensino de disciplinas escolares específicas.


 A cidade do Rio de Janeiro, vale observar, é sede de cursos de graduação com habilitação em Licenciatura Plena nas diversas áreas do conhecimento, oferecidos nas principais Universidades, cujo prestígio é reconhecido nacionalmente, tendo sua qualidade atestada nas avaliações regulares promovidas pelo Ministério da Educação. São cursos que refletem uma avançada especialização nas diversas áreas, como Ensino de História, Ensino de Ciências e Educação Matemática, apenas para citar alguns exemplos. A formação disciplinar de professores faz parte das exigências da estrutura e do funcionamento do sistema nacional de ensino.


 Em nosso entendimento, ao definir de forma generalista as atribuições do novo cargo de Professor do Ensino Fundamental – PEF, e ao prever o progressivo desaparecimento dos atuais Professores I (de disciplinas específicas), o Projeto de Lei n.º 442/2013 deixa de valorizar a formação oferecida nos cursos de Licenciatura Plena, nos quais ganham relevo resultados de estudos e pesquisas de longa maturação, que levam em conta as especificidades disciplinares de como ensinar.


 Vale observar, por fim, que, ao não considerar a formação de pós-graduação nas diferentes áreas de conhecimento nas quais os professores fizeram seus estudos para fins de progressão e enquadramento no novo Plano de Cargos, Carreira e Remuneração (artigo n.º 12, inciso IV; artigo n.º 16, inciso II; e artigo n.º 17, incisos I, II e III), o Projeto de Lei n.º 442/2013 contrapõe-se às diversas iniciativas dos cursos de pós-graduação stricto sensu, nos níveis de mestrado e doutorado, nas diversas áreas, relativas à criação de linhas de pesquisas nas áreas de ensino de disciplinas.

 Pela mesma razão, o Projeto de Lei n.º 442/2013 situa-se na contramão de importantes políticas conduzidas pelo Ministério da Educação, por meio do fomento aos cursos de mestrado profissional nas áreas de ensino de disciplinas, cujo público alvo são precisamente os professores das redes da Educação Básica de nível municipal e estadual.

 O novo “Plano de Cargos, Carreiras e Salários”, se for aprovado sem modificações, terá impactos fortíssimos na desestruturação da formação de professores. Na área de História, temos lembranças do impacto negativo da implantação de Estudos Sociais na década de 1970. A defesa da interdisciplinaridade não significa a diluição das disciplinas. O conhecimento escolar envolve a articulação de conhecimentos históricos, pedagógicos e saberes experienciais. Sua produção exige formação com domínio teórico tanto na história como na pedagogia para que se transforme em conhecimento consistente e com potencial crítico e transformador. O professor de história opera com a língua portuguesa e mobiliza conhecimentos geográficos mas precisa de domínio da especificidade de sua disciplina para que ensine História com qualidade.

 Solicitamos a retirada do projeto da pauta de votação da Câmara Municipal do Rio de Janeiro, a fim de que sejam revistos os pontos que interferem diretamente na formação inicial dos profissionais que atuam na Educação Básica, desconsiderando a especificidade das Licenciaturas e na formação continuada desses profissionais, ao não reconhecer os estudos de pós-graduação stricto sensu nas áreas específicas de conhecimento, ambas medidas que estão na contramão das leis que ordenam o sistema nacional de ensino. Que o “Plano de Cargos, Carreiras e Salários” seja discutido em audiências públicas na Câmara Municipal do Rio de Janeiro e que sejam ouvidas as associações que representam as áreas específicas de conhecimento presentes na escola e as instituições responsáveis pela formação dos professores no estado e na cidade do Rio de Janeiro.

Defendemos o diálogo e repudiamos a forma como os professores foram tratados no processo de desocupação da Câmara Municipal do Rio de Janeiro.

Rio de Janeiro, 30 de setembro de 2013.

Associação Nacional de História – Núcleo Rio de Janeiro
Departamento de História da UFF
Programa de Pós-graduação em História da UFF
Instituto de História da UFRJ
Faculdade de Educação da UFRJ
Programa de Pós-graduação em História Comparada da UFRJ
ProfHistória – Mestrado Profissional em Ensino de História da UFRJ
Departamento de História da UNIRIO
Programa de Pós-graduação em História da UNIRIO
Departamento de História da PUC-Rio
Programa de Pós-graduação em História Social da Cultura da PUC-Rio
Instituto de Ciências Humanas e Sociais da UFRRJ
Departamento de Ciências Humanas da UERJ
Programa de Pós-graduação em História Social da UERJ


quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Sobre Polivalência e Ensino de História


Em tempos de discussão acerca da implantação da figura do Professor Polivalente nas escolas municipais do Rio de Janeiro (experiência pela qual tenho passado desde que ingressei na escola onde trabalho atualmente), gostaria de registrar algumas considerações a respeito. Embora tenha encontrado, em sua grande maioria, professores contrários à prática, também tenho percebido a posição de alguns professores favoráveis a esta nova forma de atuação pedagógica (não sei se por posição ideológica ou apenas por conveniências pessoais).

 
A escola onde trabalho é um Ginásio Experimental. Estas escolas "tem como objetivo formar jovens autônomos, conscientes de seu papel na sociedade, e ajudá-los a traçar projetos de vida". Os alunos estudam em horário integral e além das disciplinas tradicionais, os alunos são acompanhados por um professor tutor, que os auxilia na construção de um projeto de vida. Nestas escolas, os professores são polivantes e atuam por áreas: a de Exatas (Ciências e Matemática) e Humanidades (Português, História e Geografia). Na escola onde trabalho, há algumas diferenças em relação à atuação do professor. Nela, o professor polivalente é nomeado professor mentor. E ao contrário dos outros Ginásios Experimentais, o professor atua em todas as áreas do conhecimento.

 
Essa ideia do papel do professor como mentor parte do princípio de que o professor deve ter um novo papel deixando de ser um mero transmissor de conteúdos prontos para se tornar um auxiliar, um orientador, um mediador entre o objeto a ser apreendido e o aluno. Nesta proposta, o aluno deixa de ser um simples ouvinte passivo e repetidor de conteúdos para se transformar num sujeito ativo no seu processo de aprendizagem, sendo estimulado por este mentor a ter uma participação ativa e procurar ele próprio as respostas para os problemas propostos através da pesquisa e experimentos. Se esta proposta está sendo colocada em prática, ou melhor, como ela está sendo aplicada na prática, é um tema para outro texto.
 

Concordo que a construção de indivíduos autônomos e críticos deve ter como pressuposto uma educação que coloca os alunos como agentes e que a construção do conhecimento deve ser um processo dialógico. Quem já leu Paulo Freire uma vez na vida, tem consciência do quanto a prática pedagógica que coloca o professor como "depositante" e o aluno como "depositário" de informações que ele deve apenas decorar e reproduzir (chamada pelo educador de "educação bancária") é oposta à proposta de educação que pretende formar o indivíduo para a autonomia (FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido).
 
A grande questão que se coloca no projeto, e que eu não concordo, é a associação feita entre o conceito de professor mentor e professor polivalente, sendo este considerado o modelo ideal de educador, ao mesmo tempo em que caracteriza o professor especialista como um praticante da "educação bancária".

A pergunta que os professores que são submetidos a este tipo de prática pedagógica e que não concordam com ela é: um professor formado e especializado em uma determinada disciplina ou em um determinado campo do conhecimento na qual ele dedicou, no mínimo, quatro anos de estudos, pode atuar com qualidade e competência numa outra disciplina distinta da sua formação?
 
 Na condição de Graduada, Licenciada e Mestre em História, eu acredito e defendo que NÃO. Na minha concepção, uma pessoa que não passa pela formação em História não tem competência para ensinar História. Apesar de ser uma disciplina relegada a um segundo plano nos programas curriculares da prefeitura, que prefere dar ênfase às disciplinas de Matemática, Português e Ciências (não por as considerar mais relevantes, mas porque são estas as disciplinas que são utilizadas como objetos de avaliação do desempenho das escolas), a História tem um papel fundamental na formação do aluno como um cidadão responsável e crítico.
 
O historiador/professor ou professor/historiador (já que o trabalho do historiador é inseparável do trabalho do professor de História) é aquele responsável pela tradução do conhecimento produzido pela ciência especializada em saber voltado à vida prática por meio da educação. É muito comum associar o historiador/professor como um mero narrador de fatos, talvez, por isso, algumas pessoas acreditam que podem ensinar a disciplina.
 
Se você perguntar a alguém quando o Brasil se tornou independente, provavelmente ele acertará a resposta. Mas, se a pergunta for por que o Brasil se tornou independente de Portugal e como ocorreu este processo, certamente ele não terá uma resposta adequada. A História, concebida como um processo, busca aprimorar o exercício da problematização da vida social. A História é uma ciência que tem seus métodos, suas técnicas e suas orientações teóricas. O saber histórico lida com conceitos, ideias e noções através das quais classificamos, ordenamos e significamos as coisas e que estruturam e atravessam a ordem social. Os conceitos tem história, são construções sociais e culturais e nem sempre foram pensados e vividos da mesma maneira.
 
O perigo de ter alguém que não é habilitado para o exercício do ensino da História está no fato de restringir seu ensinamento a uma simples narração de fatos ao invés de entendê-la como um processo, e principalmente, em incorrer no perigo de utilizar as concepções vigentes em seu tempo e em sua cultura para falar de outros tempos e outras culturas, cometendo inadequações conceituais. 

Devemos entender que a escola também produz conhecimento histórico, e esse saber não é de fato nem superior nem inferior ao acadêmico, apenas diferente, e negar sua existência é negar sua influência cultural e social. Por este motivo, é necessário descontruir a ideia de que o professor especialista é um simples reprodutor de conhecimento - ele deve ser visualizado como um mediador entre os conceitos e conteúdos sobre a História e a aprendizagem que o aluno fará desta.
 
Para finalizar e reafirmar minha convicção de que a transmissão do conhecimento histórico em sala de aula é um trabalho do especialista, do profissional das ciências humanas, e mais precisamente, do historiador/professor, reproduzo a afirmação da historiadora Laura de Melo e Souza, da Universidade de São Paulo:
 
"Amplitude e especificidade marcam concomitantemente a face da história. Se muitos podem contar histórias e até escrever sobre história, produzindo resultados interessantes, muito menos são os que podem refletir de modo consistente sobre a natureza do conhecimento histórico ou desenvolver pesquisa qualificada sobre os testemunhos deixados pelos humanos. Este é o campo exclusivo do historiador." (SOUZA, Laura de Melo e Souza. Profissão fantasma).
 
 
 

Para uma melhor reflexão sobre a negação da atuação do professor de História como um mero reprodutor de saberes e sobre a sala de aula como um espaço onde alunos e professores encenam/vivem o processo de ensino-aprendizagem e como lugar de produção/criação de conhecimento, recomendo o texto de Ilmar Rohloff de Matos - "Mas não somente assim!" Leitores, autores, aulas como texto e o ensino-aprendizagem de História.



segunda-feira, 23 de setembro de 2013

O Malho (1926)

 
O Malho, 20/03/1926. Acervo Biblioteca Nacional.
 
1926 é o ano da posse de Washington Luís na presidência da República. Há uma grande expectativa em relação ao novo governo e na resolução da crise política e dos problemas econômicos. Outro destaque é a conferência da Liga das Nações, onde representantes de vários países estão reunidos para discutir um plano de desarmamento mundial assim como o ingresso da Alemanha como membro permanente do Conselho e a criação de novas regras para o rodízio dos membros não permanentes.
 
A Liga das Nações foi criada em Versalhes, e funcionou oficialmente de 1920 a 1947. O Brasil fez parte do conselho da Liga como membro não permanente. Na Assembleia Geral da Liga, em 1926, o Brasil apresentou sua candidatura assim como a Espanha, a Polônia e a China.

A revista elogia muito o papel de Afrânio de Melo Franco, o representante do Brasil na Liga, e seu empenho na candidatura do Brasil. Faz várias críticas sobre o comportamento dos países participantes do evento que disputam uma vaga na organização e também critica a posição dos EUA na resolução sobre desarmamento, alegando que este só deseja que os outros países se desarmem enquanto que continua aumentando seu arsenal militar. A pressão sobre os candidatos é enorme e aos poucos, os países vão retirando suas candidaturas. O último a faze-lo é o Brasil
 
 
O Malho, 20/03/1926. Acervo Biblioteca Nacional.


O Malho, 27/03/1926. Acervo Biblioteca Nacional.


Em relação à representação do Brasil nas charges que tratam do tema da Assembleia da Liga das Nações, o que podemos perceber é que o país é representado por um personagem vestido com uma bermuda, uma blusa de estrelas (talvez fazendo relação com as estrelas da bandeira nacional) e um grande chapéu com a inscrição BRASIL. O elemento que nos permite identificá-lo como um indígena é o arco e flecha que o mesmo sempre trás nas mãos.